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Thursday, September 29, 2011

Sem medo e delírio no Rio de Janeiro Pt 1


                           Alma motorizada
 Perdendo a noção na minha despedida da esbórnia rock and roll
       
         Por: Claudio Moreira

Quando decidi ir ao Rock in Rio 4 passou pela minha mente as emoções da minha passagem pelas edições anteriores de 1985, 1991 e 2001. Se, no primeiro, eu era um roqueiro pueril de 15 anos emocionado por ver meus herois, no segundo, eu queria era estender minha paixão pelo rock a uma boa dose de esbórnia; no terceiro, tentava acender a velha chama do bom e velho rock and roll, mas me esbarrei num anticlímax devido à aura plastificada da edição. Dessa vez, é diversão (apenas no segundo, morava na Cidade Maravilhosa). Buscando o resto da minha energia vital fui de mala e cuia para as terras cariocas, não sem antes garantir um ônibus de primeira classe para chegar e voltar da Barra da Tijuca (aos 42 anos resolvi encarar a empreitada como uma despedida existencial dessa entrega de se jogar na estrada sedento por música.No primeiro, a aventura de ônibus foi uma atração existencial à parte para um adolescente solitário, mas agora eu queria mesmo era conforto). Na companhia de um novo amiguinho pianista de 19 anos, cheguei na fila do RioCard todo excitado em fruir aquele dia de rock and roll ao meu jeito, sob minha ótica de roqueiro nosferatu anti-colonizado.No caminho, já passava e revisava com meu novo companheiro a primeira formação do Deep Purple e contava história de Raul Seixas e do rock baiano só para saciar a curiosidade do rapaz e marcava ponto de encontro dentro da cidade do rock (sabia que iria me perder dele, pois eu estava responsável por levá-lo, mas sabia que era ele quem iria me trazer de volta devido ao meu previsível estado de bagaço, que seria certo como o “we are motorhead, we play rock and roll!!!” de Lemmy no início do show do Motorhead)

Na fila, faço camaradagem com três cariocas homônimos e nos enturmamos até a Cidade do Rock e não deixo sempre inesperadamente de surpreendê-los gritando o nome deles para que os três se virassem ao mesmo tempo sem saber exatamente com quais dos três eu queria falar mesmo, num clima de gargalhada generalizada no “buzu” de luxo. Na Barra da Tijuca, evangélicos seguravam faixas dizendo que um mundo melhor só é possível sem droga. Bela mensagem, sem dúvida, mas esqueceram que citar que droga mesmo era grande parte da programação do festival. Reclamações gerais dos metaleiros dizendo que queriam mesmo era irem para o inferno. Senti o clima de amantes de RPG no ar e sorri ao lembrar que estava com uma camisa branca do Motorhead (ainda bem, pois detesto ser confundido com nerd, ainda mais os de linhagem “from hell”!)

Ao chegar Cidade do Rock parti direto para o abraço com os vendedores de latinhas (sempre com minha senha ‘to passando mal, uma cerveja urgente!’) e o consumo acelerou em doses para lá de speed metal. Todos na fila imensa se divertiam com os vôos rasantes do helicóptero da PM atenta ao menor sinal de arrastão que não rolou, passagem de carros da Polícia Federal e o escambau (mas não vi sinal de cães farejadores). Sotaques de todo Brasil garantiam a babel da irmandade roqueira que estava num vem para lá e para cá. Quase fomos brindados com um strip de uma moça nos ombros do namorado, mas ela amarelou. Recebi uma educada chamada de atenção da polícia carioca por ter urinado no mato (no que falei educadamente que eu era um ser da mata mesmo, quase um saci pererê!) e a simpática presença de pessoal da comunidade vizinha me lembrou que estávamos no “Rio de ‘Janeura’”. Entro na Disneylândia do Rock dos meninos de palyground sem saber o que me esperava. Nos primeiros passos, recebo a resposta espiritual enviesada à minha dúvida existencial com uma inesperada vomitada básica na grama artificial de Medina (será que o almoço me fez mal?!) para susto do meu pupilo, me olhando com olhos arregalados e segurando um generoso copo de água mineral (“qual é primeira formação do Deep Purple? Bom menino,  já aprendeu mesmo!”). Não perco muito tempo explicando minha imunidade diplomática em se tratando de boemia para o garoto e abordo um ambulante que vendia chopp com um tipo de engenhoca com mangueira, antes de me refazer do susto dos R$6,50 cobrados pelo copo de 300 ml. Tentei convencê-lo sem sucesso a me acompanhar para me servir até zerar o galão. A essa altura, o colega de rock já me chamava de guru e eu  alertava o “fantasminha camarada” (na serra fluminense não se pega sol, não?!) para a rima em voga na Bahia...  

O Palco Sunset era um flashback indisgeto na minha cabeça. Matanza com seu ogro ruivo à frente nunca foi nenhum Motorhead brasileiro para mim e continuei bocejando até o velhos bangers do Korsuz (exceção apenas a canja do guitarrista dos Dead Kennedys) terminarem o show e eu perceber que todos caminhos levavam à Jazz Street sob a resistência de meu pupilo, que conseguiu encontrar um amigo dele. Foi a deixa para dar uma esticada (ops!) ao banheiro e encontrar emocionado numa esquina um velho
chapa dos tempos de Rio. Fomos direto para a Rockstreet ver o show no coreto de uma dupla de pianistas americanos e mais um baixista brasileiro arregaçando com lista de clássicos de rock, blues e muito boogie woogie. Um barato atemporal realmente transgressor. Depois, horas depois, encontrei os americanos e os abracei elogiando suas performances. O mais velho tinha 80 anos e o povo puxou o coro (“viagra, viagra, viagra!!!”) e ele dançou possesso pelo palco. Mais rock and roll que qualquer banda de emo e de metal juntas.

Depois, no mesmo coreto, foi a hora e a vez do guitarrista argentino naturalizado brasileiro Victor BIglione (que  tocou no A Cor do Som no lugar de Armandinho).Aí o bicho pegou mesmo com a  cerveja alcançando temperaturas nórdicas e o clima esquentando. O cara debulhou num repertório jazz rock violento botando a platéia na mão com direito a final com cover de Miles Davis e guitarra com distorção para a platéia (peguei nela inclusive fazendo aquele grim!!!!!). Showzaço com direito a vários “uhus!!!” puxados pela massa iniciados por mim. Respirei fundo, aspirando liberdade, e encarei a fila de chopp para me abastecer falando pelos cotovelos. Me enturmei com um pessoal do Rio Grande do Sul “bah tchê!” e consegui passar o tempo na fila numa nice para comprar 10 fichas. Uso novamente a senha de “tem um cara passando mal, urgente, me dá um chopp aí!!!” para conseguir todas as vezes agilizar meu atendimento. Sacolejando pela minha querida Rockstreet que mais parecia uma passarela de gatas de todas idade e senso de moralidade variados me perco entre olhares, sorrisos e  meus gritos de “Allman Brothers!!! Rush!!! e outros dinossauros para cada camisa de banda do meu coração que passasse por mim (teve uma menina com uma do Thin Lizzy, que jurou que gostava de Phil Lynott e sua turma antes do Metallica regravar “Whiskey in the jar” e eu, claro, que estava mais do que disposto a acreditar em tudo que ela falasse). Fiquei jogando conversa fora (ou seria dentro?!) com a turminha dela quando recuperei o fôlego em mais uma ida ao banheiro para dar de cara num bar com um grupo meio família “Do,ré, mi” tocando e cantando classic rock. Fui para frente e puxei a massa com urros de uhu! (resultado, eles falaram que foram chamados para se apresentar no coreto nos outros dias do festiva e tiraram fotos da platéia recém conquistada). Num lado, um bardo solitário puxava no violão e gaita um repertório digno recheado de Neil Young, Pink Floyd e o escamabau. Num clima de confraternização (ou será que era só eu que estava assim?!) fiz meu sinal de dedinho empenado junto a um cara todo pintado de ouro se fazendo de múmia para arrancar aplausos gerais e um sorriso de canto de boca do “paralisadão” (a essa altura as fichas de chopp terminavam e eu achava animadinho que os aplausos eram todos para mim mesmo!). 


Recuperando um pouco a noção e segurando a onda, lembrei que estava ali pelo rock pesado e resolvi dar um pulo no Palco Principal e no Sunset (não necessariamente nessa ordem) só para rejeitar os riffs do Angra, Sepultura, Gloria e Coheed and Cambria. Depois de tentar, frustado, achar o amiguinho no ponto de encontro, voltei para os braços de minha já íntima Rockstreet, onde o ambiente cultural era dos melhores e a esbórnia estava instalada em clima de carnaval rock and geral  (nesse momento já me abraçava sabe deus lá com quem, tirava fotos com yyz e participava de rodas de conversas nonsense desse e de outros mundos beirando a comunicação tribal e a Física Quântica). Vejo uma bandeira da Argentina e gritei “Viva Pappo!”, encostei, bati um papo com os hermanos e depois mudei de ares porque tinha um compromisso com o Godfather.

2 comments:

osvaldo said...

Parabens Claudio. Muito bem escrito o relato, quase que deu vontade de estar lá, mas como sou mais veterano ainda não sei se aguento mais uma maratona dessas .Certamente esta foi a unica noite que o RiR fez jus ao nome do festival.

Márcio A Martinez said...

Gonzo Esc man, seu texto é de chorar!!! Tanto de rir quanto de emocionante mesmo, um relato igual, fora do esquema jornalístico oficial, creio não haverá em canto nenhum!
Que vontade de estar lá, cara, mesmo te conhecendo há tanto tempo, talvez eu ainda ficasse apavorado com o que iria presenciar vindo de você, mas depois de ler seu texto, acho que valeria a pena correr esse risco!
Seria um grand finale de festivais pra mim também...
Não posso deixar de confesar um pouquinho de inveja por esse seu momento de ouro, que será lembrado a vida toda...
Cláudio Rules!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!